Falamos sobre isso na aula postada abaixo
Com a mídia cada vez mais fragmentada, segmentar e manter uma linha editorial consistente pode ser mais do que uma questão de princípio, pode ser a única alternativa viável.
Por Ricardo Cavallini
Jornais e revistas vivem do resultado da audiência. São sustentados por leitores leais que geram assinaturas e atraem publicidade. Mas por diversos motivos, como aumento de concorrência, fragmentação da audiência e a internet, começou a ficar difícil sustentar este modelo.
A estratégia sempre foi conseguir audiência e a tática de muitos veículos foi partir para o caminho da manchete vendedora. Não é um termo técnico, chamo assim por pura falta de criatividade. Me refiro aquela manchete cujo objetivo principal é vender papel. Ela não segue linha editoral, ela segue o que vai chamar atenção, não importa se é a fofoca do momento, a catástrofe ou o escândalo fabricado por quem precisa aparecer.
A manchete vendedora destruiu a linha editorial. Priorizar o dinheiro rápido no lugar do conteúdo consistente fez a mídia impressa perder seus leitores fiéis em troca de leitores que só queiram ver a atração principal do circo, como a modelo transando no mar ou a popstar que raspou careca ou apareceu sem calcinha.
Como a manchete atrai apenas curiosos, se cria um ciclo vicioso de matar um leão por dia, nascendo a dependência da manchete bomba. Alimentam um público que não compra o jornal ou a revista para ler determinado articulista; compra para ver as fotos e o texto que pode ser encontrado igualzinho em qualquer concorrente.
Esta política faz com que os leitores fiéis, que estão interessados no editorial verdadeiro, começem a migrar sua leitura para a web. Graças ao conteúdo abundante e ferramentas como RSS, é possível ter material de qualidade em qualquer tema desejado com imensa facilidade.
Um exemplo, quer ler sobre política? Assine um ou mais RSS dos colunistas que mais gosta, a lista não é pequena, fora alguns que não colocaria e outros que devo ter esquecido:
* Alon Feuerwerker
* Ancelmo Gois
* Claudio Humberto
* Cristina Lôbo
* Diego Casagrande
* Diogo Mainardi
* Fernando Rodrigues
* Guilherme Fiuza
* Jorge Serrão
* Josias de Souza
* Lucia Hippólito
* Miriam Leitão
* Noblat
* Olavo de Carvalho
* Patrícia Campos Mello
* Reinaldo Azevedo
Aqui vale um parênteses, eu sei muito bem que esta galera escreve de graça na web mas é sustentada justamente pelos veículos de massa (TV, jornal, revista) que pagam seus salários. Por isso acho importante discutir esta questão.
Mas e os leitores alcançados pela política da manchete vendedora? Bom, estes também estão fugindo para a web. A tática da manchete vendedora não deu certo, o tiro saiu pela culatra. Escândalos e outros conteúdos fúteis são encontrados com muito mais facilidade, riqueza, velocidade e pontualidade na internet.
Na internet não tem apenas a foto da popstar careca, tem também uma entrevista em vídeo com alguém que presenciou a bizarrice. E ainda uma seqüência de imagens tirando sarro do novo look.
Aqui vale outro parênteses - a postura de manchete vendedora não é exclusividade dos impressos; alguns blogs utilizam da mesma tática para captar novos visitantes vindos de ferramentas de busca. E vivem o mesmo problema também, o índice de novos visitantes é gigante. São poucos visitantes fiéis, a maioria entra apenas pra ver um post e muitas vezes nem guarda o nome do blog, muito menos seu endereço.
Atentos a mudança, alguns jornais como o Independent, The Times e o The Guardian realizaram mudanças radicais, partindo para um novo formato.
The GuardianFicaram mais compactos (um jornal mais fácil de manusear), com programação visual mais leve, mais colorida e com papel que não suja a mão.
Mas a mudança mais necessária não é no formato, e sim no conteúdo. E até antes disso, parar de discutir a tática (de como conseguir audiência) e voltar a discutir estratégia. Será que deveriam lutar tanto pelo crescimento da audiência? Audiência é realmente algo viável de se buscar quando temos a mídia cada vez mais fragmentada? Ademais, audiência é o que realmente a publicidade (quem paga as contas) vai continuar buscando?
Será que o certo não seria aceitar sua vocação para nicho? Entender que isso não é de todo mal e que pode (e deve) ser uma boa fonte de receita.
De certa forma, alguns veículos impressos (principalmente revistas) já representam um nicho. Por isso é tão fácil diferenciar entre um leitor do Estadão e da Folha ou entre um leitor da IstoÉ e da Veja. Muitos odeiam o Reinaldo Azevedo e acham o Diogo Mainardi o belzebu, mas um outro tanto compra a Veja justamente por causa dos dois colunistas.
Os números de audiência perdem força mas o grau de atenção e fidelização aumentam. Segmentar e manter uma linha editorial consistente pode passar a ser mais do que apenas uma questão de princípio, pode ser a única alternativa viável. [Webinsider]
Sobre o autor
Ricardo Cavallini é profissional de comunicação interativa, professor de marketing direto na ABEMD, autor do livro "O marketing depois de amanhã" e editor do Coxa Creme
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